Conheça alternativas de acesso de pessoas com deficiência visual a obras de museus
03/10/2024
Acessibilidade e inclusão são temas que marcam a 18ª Primavera dos Museus, celebrada nesta semana em instituições de todo o Brasil. Peças táteis e audiodescrição são recursos de acessibilidade em exposições dos museus
Apreciar o trabalho de um artista visual, como um pintor ou fotógrafo, não é uma experiência impossível para pessoas cegas e com baixa visão. Em museus do Ceará, recursos como peças táteis e audiodescrição garantem às pessoas com deficiência visual o direito de acessar e interagir com as obras de arte dos seus acervos.
✅ Clique aqui para seguir o canal do g1 Ceará no WhatsApp
Os materiais permitem que o usuário conheça informações que vão além das cores, das texturas e dos elementos dispostos na obra. Eles também abordam o contexto e as mensagens subjetivas das peças por meio dos sentidos do tato e da audição.
Neste ano, a 18ª Primavera dos Museus estimulou mais de 900 instituições brasileiras a promoverem o tema “Museus, acessibilidade e inclusão”, com atividades e temas que abordam como estes espaços podem ser mais acolhedores e inclusivos. A iniciativa é proposta pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram).
LEIA TAMBÉM:
História das ferrovias do Ceará é contada em exposições gratuitas no Centro de Fortaleza
‘Mestres da cultura’: conheça a história de personalidades consideradas tesouros vivos por preservarem saberes no Ceará
Turismo literário no Ceará: dicas de locais para visitar e conhecer referências da literatura
Os museus têm o desafio de superar barreiras físicas e culturais no caminho das pessoas com deficiência. Desta forma, eles buscam promover atividades e atrair todos os públicos, naturalizar o acesso de quem historicamente se sentiu distanciado destes espaços.
Nesta reportagem, o g1 utiliza o recurso da descrição de imagem para acompanhar cada fotografia e permitir o acesso de pessoas com deficiência visual aos conteúdos visuais. Os textos foram escritos pela pesquisadora Rebeca Barroso, entrevistada para esta reportagem.
Criando experiências sensoriais acessíveis
A artista invisual Rebecca Barroso atua como consultora em projetos de acessibilidade para museus
Arquivo Pessoal
Descrição: Becca está em pé ao lado de sua filhote de pastor branco suíço, Lua. Becca tem cabelos escuros e está vestindo uma camiseta branca com mangas pretas e o número 19 estampado na frente, além de calças pretas e tênis brancos. Ela segura a coleira de Lua, que está sentada ao seu lado com a língua de fora, parecendo relaxada e feliz. A parede tem pintura colorida e abstrata, com formas geométricas em várias cores, como azul, laranja, verde e vermelho. O chão é de grama verde.
Frequentar museus e exposições tem despertado emoções conflitantes para Rebecca Barroso, que é pesquisadora, artista invisual e doutoranda em Linguística Aplicada pela Universidade Estadual do Ceará (UECE).
Por um lado, espaços que possuem infraestrutura e atitudes excludentes dificultam a experiência para ela como pessoa cega. Por outro, as oportunidades que ela tem de prestar consultoria em projetos de acessibilidade representam momentos de conquista.
Com isso, Rebecca busca diminuir as dificuldades sentidas por pessoas com limitações ou deficiências visuais nos equipamentos de cultura.
“Em termos de barreiras arquitetônicas, encontramos desde a falta de sinalização tátil até a ausência de rampas e elevadores adequados. Em relação às barreiras atitudinais, muitas vezes os funcionários não estão capacitados para atender o público com deficiência de forma inclusiva e respeitosa”, explica a pesquisadora.
Desde 2019, a atuação de Rebecca como audiodescritora e consultora em exposições e museus é voltada para acessibilizar as obras de artes visuais em instituições do Ceará. Ela participa de projetos que se complementam para criar peças táteis e recursos de audiodescrição (ver detalhes abaixo).
A artista fica responsável por uma fase de testes chamada de harmonização entre as peças táteis e os áudios. É quando ela avalia, como usuária, se as informações trazidas pelos dois recursos estão adequadas e promovem uma boa experiência de acesso à obra que será exposta no museu.
Foi assim que ela contribuiu para o desenvolvimento dos recursos de acessibilidade da exposição fotográfica “Claudia Andujar. Minha vida em dois mundos”, em cartaz na Pinacoteca do Ceará.
Poder avaliar os recursos na fase de testes pela perspectiva de quem vivencia limitações visuais é importante nesse processo.
“Audiodescrição e obras táteis são algumas das ferramentas que uso para garantir que todas as pessoas possam se engajar e se conectar com a arte, independentemente da visão. Ser uma artista invisual é trabalhar para que a arte seja acessível a todos”, partilha Rebeca.
O resultado desse trabalho é permitir que cada pessoa experimente novas dimensões de acesso por meio do toque, da audição e da conexão emocional.
“Essas práticas beneficiam não só as pessoas com deficiência, mas também o público em geral, pois promovem empatia e uma maior conscientização sobre as diferentes formas de percepção. O impacto dessas iniciativas vai além da experiência individual, pois ajudam a criar um ambiente cultural mais inclusivo, onde todos têm seu lugar garantido”, celebra Rebeca.
Explorando as imagens pelo tato
Peças táteis permitem que pessoas cegas ou com baixa visão apreciem obras visuais
Projeto Fotografia Tátil/Divulgação
Descrição: Duas mãos exploram cuidadosamente uma fotografia em relevo. A imagem tátil retrata um prédio histórico com janelas e telhado ornamentado, destacando detalhes de sua arquitetura. As mãos percorrem as linhas e texturas, sentindo os contornos do edifício e as faixas de pedestre abaixo dele, criando uma experiência sensorial única.
No Ceará, um grupo vinculado ao curso de Design da Universidade Federal do Ceará (UFC) tem desenvolvido, há cerca de dez anos, soluções que transportam informações sobre as artes visuais para as pontas dos dedos.
O projeto “Fotografia Tátil como ferramenta de inclusão social de pessoas com deficiência visual” tem sido um dos parceiros de equipamentos culturais que solicitam o desenvolvimento de peças táteis para as suas exposições.
A inspiração para o projeto veio quando o professor Roberto Vieira foi convidado a fazer doações para a compra de bengalas para uma associação de pessoas cegas, ainda em 2013. No ano seguinte, quando começou a lecionar na UFC, ele quis trazer ideias para promover mais acessibilidade para este público.
Uma das primeiras atividades foi articular uma oficina para formação de fotógrafos cegos, com auxílio de fotógrafos profissionais e amadores. Após selecionar imagens feitas pelas pessoas com deficiência visual, o projeto buscou criar peças táteis que permitissem o acesso dos conteúdos pelo toque.
Desde então, o projeto tem desenvolvido peças com diversos materiais, como superfícies de acrílico e MDF. Esta técnica se concretiza com o auxílio de máquinas de corte a laser ou impressoras 3D.
Projeto da UFC produz peças táteis a partir de materiais diversos em projetos de acessibilidade
Projeto Fotografia Tátil/Divulgação
Descrição: Um grupo de quatro jovens está reunido em volta de uma mesa expositora, sorrindo e apresentando peças coloridas em relevo que representam figuras e paisagens. À frente deles, sobre a mesa, estão várias obras de arte tátil compostas de recortes vibrantes, prontos para serem explorados pelos sentidos. O ambiente exala criatividade e colaboração.
Atualmente, é possível conferir quatro peças desenvolvidas em acrílico na exposição de fotografias da artista suíça Claudia Andujar, na Pinacoteca do Ceará.
“Nós optamos pelo acrílico nas últimas peças de fotografia porque permite imprimir a própria foto original e colocar no fundo. Como o acrílico é transparente, a peça fica visualmente interessante para quem tem baixa visão. A própria foto vai permitir o contraste de alguns elementos. E para a pessoa cega e pessoa de baixa visão, o tato está nas camadas”, explica o professor Roberto Vieira.
Mas, antes de chegar à materialidade, elas contam com um processo de planejamento para que cada peça corresponda ao conteúdo de uma obra visual.
Para construir as peças de fotografia tátil, são levados em conta os seguintes aspectos:
Os elementos principais e secundários da obra
A quantidade de planos da obra visual
As texturas a serem destacadas
Em discussão com o grupo, que conta com professores, oito bolsistas e voluntários, os materiais são discutidos para permitir o entendimento das obras e atender às características também do espaço de exposição.
Peça tátil em dois níveis auxilia a compreender sobreposição nas fotografias de Claudia Andujar
Marília Camelo/Pinacoteca do Ceará/Divulgação
Descrição: Em uma caixa de acrílico transparente está uma peça tátil que representa uma imagem tridimensional. Ao lado da peça, uma placa em braille oferece informações acessíveis para visitantes com deficiência visual. O conjunto, elegante e minimalista, convida à exploração tátil em uma exposição que valoriza a inclusão sensorial.
Na Pinacoteca, a peça que acompanha uma das fotografias de Claudia Andujar foi pensada para ter dois níveis. A escolha realça o recurso da sobreposição, explorado pela artista quando registrou imagens do povo Yanomami no extremo norte do Brasil na década de 1970.
Assim, é como se a imagem tivesse dois planos a serem observados: o rosto de uma pessoa indígena por trás da sobreposição de um negativo, elemento incluído nas experimentações da artista.
“Nessas peças táteis, nós tentamos representar a foto. Nós queremos que a pessoa tenha a percepção do plano, e nós sentimos a necessidade de criar um plano superior, onde eu toco embaixo e depois eu toco em cima, porque tem elementos que se sobrepõem”, detalha Roberto.
Nos últimos cinco anos, o projeto colaborou com diversas instituições. Uma delas é o Museu de Arte da UFC, considerado também um espaço de experimentações. Outros foram o Museu da Imagem e do Som, o Museu da Cultura Cearense, o Museu da Fotografia Fortaleza e a Caixa Cultural Fortaleza.
O complemento pelos sons
Audiodescrição complementa as peças táteis para o acesso de pessoas com deficiência visual em museus
Museu da Fotografia Fortaleza/Divulgação
Descrição: Dois jovens, ambos usando fones de ouvido, estão de costas para a câmera, concentrados em uma exposição interativa. À frente deles, uma mesa expositora com relevos táteis em madeira e fones distribuídos ao longo da superfície. A sala, com paredes cinzas, é silenciosa e convida à exploração sensorial. No chão, há uma sinalização tátil amarela que orienta o percurso.
Desde 2019, o projeto da UFC tem se aliado ao Laboratório de Tradução Audiovisual (Latav), da Universidade Estadual do Ceará (Uece). Assim, o desenvolvimento das peças táteis é feito em paralelo ao planejamento da audiodescrição. Isso porque as técnicas se complementam, como explica Roberto Vieira.
Vinculado à pós-graduação em Linguística Aplicada, o laboratório começou desenvolvendo legendagem audiodescrição para o teatro, para o cinema e para a televisão. Uma destas atuações foi auxiliando com recursos de acessibilidade no festival de cinema Cine Ceará.
Elaborar descrições para pinturas e fotografias exigiu uma nova perspectiva, como explica Vera Santiago, pesquisadora do Latav. Isso porque em um filme, a audiodescrição ajuda a compreender elementos visuais e aspectos que acontecem na cena, se somando ao texto já presente no roteiro.
“Numa obra de arte visual bidimensional, não existe esse outro texto, somente a audiodescrição. Então, qual é a principal questão quando eu descrevo um quadro ou uma fotografia? É descrever a arte: o que é que singulariza aquele artista, o que faz com que as pessoas que enxergam tenham uma fruição, uma emoção”, relata a pesquisadora.
Desta forma, a pessoa que tateia aquela mesma fotografia do indígena Yanomami na exposição de Claudia Andujar pode, também, ouvir a descrição que contextualiza as emoções evocadas pela imagem e a técnica utilizada pela artista.
Juntar o trabalho de audiodescritores com as peças táteis foi possível quando estes projetos se reuniram com museólogos e a equipe do setor educativo do Museu da Fotografia Fortaleza em 2019. Naquele ano, o grupo iniciava o processo que levou à exposição Na Ponta dos Dedos, inaugurada dois anos depois (ver abaixo).
De acordo com Vera Santiago, essa colaboração contou, desde o início, com a presença de pessoas com deficiência se envolvendo nas discussões e falando das suas necessidades e experiências nos equipamentos culturais. Essa representatividade está presente até hoje.
“A harmonização entre as peças táteis e a audiodescrição é o processo principal. A consultora, que é a pessoa com deficiência visual e também audiodescritora, tateia as peças e ouve a audiodescrição e vai fazendo as sugestões dela. Ela diz onde está com problema, se tem que mudar a direção… Isso é o que garante o sucesso desse processo”, acredita a pesquisadora.
A missão de atrair todos os públicos
Com auxílio de mapa tátil, pessoas com deficiência visual acessam percurso de exposição na Pinacoteca do Ceará
Marília Camelo/Pinacoteca do Ceará/Divulgação
Descrição: Um mapa tátil de contornos claros e linhas precisas intitulado “MINHA VIDA EM DOIS MUNDOS”. O mapa, em alto relevo, apresenta rotas e marcos representados por símbolos e textos em braille. Ícones identificam áreas acessíveis e peças interativas. O design acessível proporciona uma experiência imersiva para todos os visitantes da exposição.
Na Pinacoteca do Ceará, peças táteis e pontos de audiodescrição se somam a um conjunto de recursos pensados para promover mais acessibilidade: vídeos com tradução em Libras, textos curatoriais disponíveis em braille, rampas para facilitar o acesso e piso tátil.
Disponibilizar caminhos para que o conteúdo seja apreciado por pessoas com diferentes tipos de deficiências é trabalhar para garantir o direito dessas pessoas de acessar os equipamentos culturais, ressalta Alana Oliveira, Supervisora de Acessibilidade na instituição.
Antes de adentrar a mostra atual com as fotografias de Claudia Andujar, o público encontra um mapa tátil sinalizando o que será encontrado como objeto físico em cada espaço.
As quatro peças táteis foram escolhidas para representar a complexidade e os momentos diferentes da trajetória da artista. Em cada uma delas, o público pode conferir instruções em braille sobre a utilização dos materiais.
A audiodescrição é ativada em aparelhos celulares por aproximação por meio da tecnologia NFC (sigla para “comunicação por campo de proximidade”).
Quando o aparelho celular não tem este dispositivo ativado, membros da equipe do museu estão prontos para auxiliar e oferecer um tablet que fica disponível para acompanhar a exposição.
Conforme Alana Oliveira, um dos trabalhos da equipe é mostrar para pessoas com deficiências que elas podem acessar o museu e são bem-vindas. Isto é feito em visitas a associações e instituições, além de fazer convites a pessoas que são referência entre pessoas cegas ou surdas, por exemplo.
“Não é interessante a gente fazer programações específicas de acessibilidade, pois é como se estivéssemos excluindo essas pessoas ao fazer uma programação própria pra elas. Então a gente faz uma programação com uma temática, convida essas pessoas e também convida o público vidente para que não seja uma política de exclusão. A intenção é sempre naturalizar esses serviços”, comenta a supervisora.
Recursos de acessibilidade buscam garantir o acesso de todos à Pinacoteca do Ceará
A forma como a Pinacoteca se comunica também é pensada para que todos os públicos estejam contemplados. Os vídeos produzidos, por exemplo, incluem legendas, audiodescrição que auxiliam a compreender os elementos mostrados e tradução em Libras.
Uma das estagiárias do setor de Comunicação, Lídia Sampaio, é ex-aluna do projeto Fotografia Tátil, da UFC. Enquanto era bolsista do projeto, ela visitava espaços de museus para avaliar as condições existentes e auxiliar a difundir os conceitos de acessibilidade. Agora, Lídia tem a oportunidade de fazer a diferença como parte da equipe da Pinacoteca.
“A gente usa muito do recurso da acessibilidade para pensar nos conteúdos da comunicação. Então sempre é uma parceria desenvolvida para que juntos possamos estar gerando essa acessibilidade não só no espaço físico do museu”, enfatiza Lídia.
Ainda de acordo com Alana Oliveira, toda a equipe da instituição passa por formações para garantir a inclusão de todos os públicos. Isto inclui curso de Libras e orientações sobre as melhores formas para auxiliar as pessoas com deficiências.
Exposição com fotografias de pessoas cegas
Exposição Na Ponta dos Dedos foi montada com fotografias feitas por pessoas cegas
Museu da Fotografia Fortaleza/Divulgação
Descrição: Uma mulher de cabelos castanhos cacheados, usando uma blusa laranja com detalhes vermelhos, interage com uma parede cinza escuro na qual está escrito “NA PONTA DOS DEDOS” em letras brancas. À sua frente, estão dispostos pontos em braille, e a mulher explora os pontos com a mão direita, estabelecendo uma conexão direta com a obra.
Inaugurado em 2017 com uma forte ação social, o Museu da Fotografia Fortaleza foi uma das instituições pioneiras ao promover debates e conexões para pensar a acessibilidade dentro dos museus do Ceará.
Como relembra Tomaz Maranhão, coordenador de Ação Cultural do equipamento, as primeiras ideias surgiram em 2018, com a visita de João Kulcsár, que desenvolve projetos de alfabetização visual há mais de 15 anos.
As atividades levaram ao projeto Na Ponta dos Dedos, que promoveu formações para fotógrafos com deficiência visual. A iniciativa também marcou a aproximação dos projetos de Fotografia Tátil, da UFC, e do Laboratório de Tradução Audiovisual, da Uece.
Giro fotográfico pela cidade fez parte da formação de fotografia para pessoas cegas
Museu da Fotografia Fortaleza/Divulgação
Descrição: Dois participantes estão juntos em um jardim urbano. À esquerda, uma mulher de cabelos grisalhos e óculos está orientando um homem de boné vermelho a usar uma câmera fotográfica. Eles vestem camisetas pretas com detalhes azuis e compartilham um momento de concentração. A mulher segura suavemente o braço do homem enquanto ele levanta a câmera em direção a uma árvore. Ao fundo, uma rua arborizada e um prédio histórico com janelas arqueadas compõem o cenário.
Com planos de aula acessíveis, os cursos foram oferecidos para pessoas do Instituto dos Cegos e da Escola Instituto dos Cegos, de Fortaleza. Foi possível, por exemplo, construir peças táteis para auxiliar os alunos na compreensão de técnicas da fotografia, como a regra dos terços e aspectos para a composição de imagens.
Os resultados das formações foram reunidos na exposição Na Ponta dos Dedos, que foi inaugurada em 2021 no Museu da Fotografia e seguiu para outros espaços da capital.
“Ela consistia em basicamente expor as fotografias que eles produziram durante o curso, só que, em vez de a gente colocar a imagem impressa no papel em destaque, a gente deu destaque para as peças. Então, era uma exposição de peças táteis. Tinha a imagem, mas a imagem era muito pequena em relação à peça, era só para ter uma referência ali para quem era vidente”, explica Tomaz Maranhão.
A partir das necessidades do público, o museu também seguiu fazendo outras adaptações para a mostra: os suportes das bancadas, por exemplo, foram ajustados para que pessoas com cadeiras de rodas pudessem se aproximar mais das obras.
No museu, a acessibilidade também continua sendo um elemento prioritário. Para cada nova mostra, há uma conversa com a curadoria para que cada núcleo de exposição tenha pelo menos cinco peças táteis, explica Tomaz Maranhão.
Projeto Ampliando Olhares utiliza a linguagem da fotografia com crianças e jovens neurodivergentes
Museu da Fotografia Fortaleza/Divulgação
Descrição: Uma cena envolvente onde três pessoas colaboram para capturar uma fotografia. À esquerda, uma jovem de cabelos cacheados auxilia um homem em cadeira de rodas, que veste um colete de suporte. Ela segura sua câmera, orientando-o para fotografar um vaso de planta emoldurado por pneus coloridos pendurados na parede, enquanto um terceiro participante observa atentamente à direita, vestindo uma camisa roxa.
Outra ação recente é o projeto Ampliando Olhares, que é voltado para crianças e adolescentes neurodivergentes e acontece em parceria com instituições de Fortaleza.
“A gente tem parceria com algumas fundações onde a gente desenvolveu uma metodologia para ensinar fotografia para crianças e jovens dentro do espectro autista e com síndrome de Down. A ideia é levar a fotografia para um lugar terapêutico, um lugar lúdico, da brincadeira, que colabora também com o bem-estar das pessoas”, comenta Tomaz.
Além disso, a instituição segue como um espaço para testar novas ideias. Isso vale tanto para os projetos das universidades como para os membros da equipe que se envolvem em pesquisas sobre o tema.
Desafios para ampliar a acessibilidade
A inclusão plena nos espaços dos museus ainda é um longo caminho a ser trilhado. Para o professor Roberto Vieira, é perceptível o aumento da demanda por peças táteis nos últimos anos no Ceará.
“O que nós entendemos é que não podemos atender essa demanda crescente e que ainda tende a ser muito maior. À medida em que vamos fazendo essas exposições, mais espaços vão sentir a necessidade de ter exposições acessíveis”, comenta o pesquisador.
Para isso, o projeto tem realizado formações para estimular que os museus tenham equipes internas que consigam planejar e desenvolver os próprios recursos de acessibilidade.
A composição das equipes também é entendida como uma chave para a democratização do acesso. Como aponta a artista Rebeca Barroso, a falta de profissionais com deficiências nestes espaços é um ponto crítico, impedindo que as soluções de acessibilidade sejam pensadas a partir das necessidades reais de cada público.
Na Pinacoteca do Ceará, o movimento tem sido o de atrair profissionais com deficiências e pessoas que são aliadas da causa. Na equipe de acessibilidade, por exemplo, há três pessoas surdas atuando na criação de percursos e sinais que acolham a comunidade.
“Atualmente, a gente trabalha muito nessa vertente da comunidade surda, mas nessa intenção de expandir. Queremos que a nossa equipe cresça com outras pessoas e outros perfis para que ela seja cada vez mais plural”, destaca Alana Oliveira.
Como ressalta a supervisora, é importante lembrar que a chegada das pessoas com deficiências até o museu já acontece depois que elas superaram várias barreiras de acesso ao tentar transitar pela cidade.
Outro desafio é a falta de investimento em propostas de acessibilidade, conforme aponta a pesquisadora Vera Santiago. Para ela, seria importante priorizar este financiamento nos museus e também nas universidades, dando mais condições para o funcionamento dos projetos e laboratórios vinculados ao tema.
“O que nós queríamos realmente é que os museus começassem a contratar os profissionais que nós estamos preparando e tivessem uma atitude como os museus que agora estão em parceria conosco”, complementa Vera.
Desta forma, a esperança é ver as experiências já iniciadas sendo replicadas para ampliar o acesso, a inclusão e a representatividade nos equipamentos culturais.
Assista aos vídeos mais vistos do Ceará: